domingo, 1 de fevereiro de 2009
Aurora
Aurora
Noite de plenilúnio! A soberba dos agapantos
Desmaia, delicada, entre sopros de inquietude.
Ao longe – tão perto dali, afinal – soçobram prantos
Como os que se ouvem às aves agoirentas, amiúde.
Hedionda a luz, a daquele luar a parir quebrantos,
A derramar espúrias gotas de pachorrenta virtude,
Soltando as mais claras sombras, silhuetas de Santos,
Alvas trevas, ais tão doces que não há quem os desnude.
– Horizonte! Que novas me dás? (...) Nada! Nem um só som!
Encolho-me no valhacouto que construí com a vida
E expludo em suavíssimas pétalas de dor contida!
Oloroso e brando, sussurra um zéfiro de bom-tom!
Agora, espreguiço-me e como se acordara vejo
O escuro a desfazer-se, e lá ao fundo, o alvor benfazejo.
quarta-feira, 7 de maio de 2008
Minha Pátria é a Língua Portuguesa
EM DEFESA DA LÍNGUA PORTUGUESA
CONTRA O ACORDO ORTOGRÁFICO
(Ao abrigo do disposto nos Artigos n.os 52.º da Constituição da República Portuguesa, 247.º a 249.º do Regimento da Assembleia da República, 1.º n.º 1, 2.º n.º 1, 4.º, 5.º, 6.º e seguintes da Lei que regula o exercício do Direito de Petição)
Ex.mo Senhor Presidente da Assembleia da República Portuguesa
Ex.mo Senhor Primeiro-Ministro
1 – O uso oral e escrito da língua portuguesa degradou-se a um ponto de aviltamento inaceitável, porque fere irremediavelmente a nossa identidade multissecular e o riquíssimo legado civilizacional e histórico que recebemos e nos cumpre transmitir aos vindouros. Por culpa dos que a falam e escrevem, em particular os meios de comunicação social; mas ao Estado incumbem as maiores responsabilidades porque desagregou o sistema educacional, hoje sem qualidade, nomeadamente impondo programas da disciplina de Português nos graus básico e secundário sem valor científico nem pedagógico e desprezando o valor da História.
Se queremos um Portugal condigno no difícil mundo de hoje, impõe-se que para o seu desenvolvimento sob todos os aspectos se ponha termo a esta situação com a maior urgência e lucidez.
Lamenta-se que as entidades que assim se arrogam autoridade para manipular a língua (sem que para tal gozem de legitimidade ou tenham competência) não tenham ponderado cuidadosamente os pareceres científicos e técnicos, como, por exemplo, o do Prof. Doutor Óscar Lopes, e avancem atabalhoadamente sem consultar escritores, cientistas, historiadores e organizações de criação cultural e investigação científica. Não há uma instituição única que possa substituir-se a toda esta comunidade, e só ampla discussão pública poderia justificar a aprovação de orientações a sugerir aos povos de língua portuguesa.
O Ministério da Cultura pode facilitar os encontros de escritores, linguistas, historiadores e outros criadores de cultura, e o trabalho de reflexão crítica e construtiva no sentido da maior eficácia instrumental e do aperfeiçoamento formal.
É inaceitável a supressão da acentuação, bem como das impropriamente chamadas consoantes “mudas” – muitas das quais se lêem ou têm valor etimológico indispensável à boa compreensão das palavras.
Não faz sentido o carácter facultativo que no texto do Acordo se prevê em numerosos casos, gerando-se a confusão.
Convém que se estudem regras claras para a integração das palavras de outras línguas dos PALOP, de Timor e de outras zonas do mundo onde se fala o Português, na grafia da língua portuguesa.
A transcrição de palavras de outras línguas e a sua eventual adaptação ao português devem fazer-se segundo as normas científicas internacionais (caso do árabe, por exemplo).
Recusamos deixar-nos enredar em jogos de interesses, que nada leva a crer de proveito para a língua portuguesa. Para o desenvolvimento civilizacional por que os nossos povos anseiam é imperativa a formação de ampla base cultural (e não apenas a erradicação do analfabetismo), solidamente assente na herança que nos coube e construída segundo as linhas mestras do pensamento científico e dos valores da cidadania.
Os signatários,
Ana Isabel Buescu
António Emiliano
António Lobo Xavier
Eduardo Lourenço
Helena Buescu
Jorge Morais Barbosa
José Pacheco Pereira
José da Silva Peneda
Laura Bulger
Luís Fagundes Duarte
Maria Alzira Seixo
Mário Cláudio
Miguel Veiga
Paulo Teixeira Pinto
Raul Miguel Rosado Fernandes
Vasco Graça Moura
Vítor Manuel Aguiar e Silva
Vitorino Barbosa de Magalhães Godinho
Zita Seabra
Já somos muitos! Quem quiser juntar-se-nos só tem de ir a Manifesto em Defesa da Língua Portuguesa contra o Acordo Ortográfico)
domingo, 19 de agosto de 2007
Para o meu Amigo G.
Aniversário
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.
Quando vim a.olhar para a vida, perdera o sentido da vida.
Sim, o que fui de suposto a mim-mesmo,
O que fui de coração e parentesco.
O que fui de serões de meia-província,
O que fui de amarem-me e eu ser menino,
O que fui — ai, meu Deus!, o que só hoje sei que fui...
A que distância!...
(Nem o acho... )
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!
O que eu sou hoje é como a umidade no corredor do fim da casa,
Pondo grelado nas paredes...
O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas lágrimas),
O que eu sou hoje é terem vendido a casa,
É terem morrido todos,
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio...
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos ...
Que meu amor, como uma pessoa, esse tempo!
Desejo físico da alma de se encontrar ali outra vez,
Por uma viagem metafísica e carnal,
Com uma dualidade de eu para mim...
Comer o passado como pão de fome, sem tempo de manteiga nos dentes!
Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui...
A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais copos,
O aparador com muitas coisas — doces, frutas, o resto na sombra debaixo do alçado,
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos. . .
Pára, meu coração!
Não penses! Deixa o pensar na cabeça!
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus!
Hoje já não faço anos.
Duro.
Somam-se-me dias.
Serei velho quando o for.
Mais nada.
Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira! ...
O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!...
Fernando Pessoa, Poesias de Álvaro de Campos
segunda-feira, 16 de julho de 2007
Liberté
Liberté
Sur mes cahiers d'écolier
Sur mon pupitre et les arbres
Sur le sable de neige
J'écris ton nom
Sur les pages lues
Sur toutes les pages blanches
Pierre sang papier ou cendre
J'écris ton nom
Sur les images dorées
Sur les armes des guerriers
Sur la couronne des rois
J'écris ton nom
Sur la jungle et le désert
Sur les nids sur les genêts
Sur l'écho de mon enfance
J'écris ton nom
Sur tous mes chiffons d'azur
Sur l'étang soleil moisi
Sur le lac lune vivante
J'écris ton nom
Sur les champs sur l'horizon
Sur les ailes des oiseaux
Et sur le moulin des ombres
J'écris ton nom
Sur chaque bouffées d'aurore
Sur la mer sur les bateaux
Sur la montagne démente
J'écris ton nom
Sur la mousse des nuages
Sur les sueurs de l'orages
Sur la pluie épaisse et fade
J'écris ton nom
Sur les formes scintillantes
Sur les cloches des couleurs
Sur la vérité physique
J'écris ton nom
Sur les sentiers éveillés
Sur les routes déployées
Sur les places qui débordent
J'écris ton nom
Sur la lampe qui s'allume
Sur la lampe qui s'éteint
Sur mes raisons réunies
J'écris ton nom
Sur le fruit coupé en deux
Du miroir et de ma chambre
Sur mon lit coquille vide
J'écris ton nom
Sur mon chien gourmand et tendre
Sur ses oreilles dressées
Sur sa patte maladroite
J'écris ton nom
Sur le tremplin de ma porte
Sur les objets familiers
Sur le flot du feu béni
J'écris ton nom
Sur toute chair accordée
Sur le front de mes amis
Sur chaque main qui se tend
J'écris ton nom
Sur la vitre des surprises
Sur les lèvres attendries
Bien au-dessus du silence
J'écris ton nom
Sur mes refuges détruits
Sur mes phares écroulés
Sur les murs de mon ennui
J'écris ton nom
Sur l'absence sans désir
Sur la solitude nue
Sur les marches de la mort
J'écris ton nom
Sur la santé revenue
Sur le risque disparu
Sur l'espoir sans souvenir
J'écris ton nom
Et par le pouvoir d'un mot
Je recommence ma vie
Je suis né pour te connaître
Pour te nommer
Liberté.
quinta-feira, 14 de junho de 2007
Liberdade
Ai que prazer
Não cumprir um dever.
Ter um livro para ler
E não o fazer!
Ler é maçada,
Estudar é nada.
O sol doira sem literatura.
O rio corre bem ou mal,
Sem edição original.
E a brisa, essa, de tão naturalmente matinal
Como tem tempo, não tem pressa...
Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.
Quanto melhor é quando há bruma
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!
Grande é a poesia, a bondade e as danças...
Mas o melhor do mundo são as crianças,
Flores, música, o luar, e o sol que peca
Só quando, em vez de criar, seca.
E mais do que isto
É Jesus Cristo,
Que não sabia nada de finanças,
Nem consta que tivesse biblioteca...
Fernando Pessoa - Poesias Inéditas
domingo, 10 de junho de 2007
Telejornal
Telejornal
– Informam-me, neste momento: os corcéis cor de laranja
Romperam os cercados e cavalgam os horizontes.
Atenção, estúdio! A locutora desvia a franja,
E sorri: – Também foram avistados alguns bisontes.
Prossegue: – Arco-íris cinzentos – diz, enquanto esbanja
Simpatia – protestam calados, dizem várias fontes.
(Pausa). – Prevê-se que esta manifestação abranja
Estepes, serras, selvas, vales, tundras, savanas e montes.
– Economia: as taxas de juro foram detidas
Por atentado à Esperança que, abalada, se tornou vã.
– E agora o desporto: foram há pouco batidas
As marcas que tinham dado o recorde à campeã
Do desespero, da penúria e das causas perdidas.
– Assim vai o nosso mundo! Boa noite! Até amanhã!
sexta-feira, 8 de junho de 2007
Inanição
Guio meus passos por expectativas inesperadas. Sigo. Alguns escolhos. Insisto. Tombo. Ergo-me. Continuo. Difícil, o caminho. Não desisto. Prossigo. Tropegamente, porém. E avanço. E avanço.
Para onde? Porquê? Com que fim?
E se o fim não é o que almejo? E se a recompensa não merece o esforço? E se o desfecho se transforma em desilusão?
Placidamente, sento-me naquela pedra a que chamo irmã, e choro os meus medos.
quarta-feira, 6 de junho de 2007
Pelo sonho é que vamos...
Comovidos e mudos.
Chegamos? Não chegamos?
Haja ou não haja frutos,
pelo sonho é que vamos.
Basta a fé no que temos,
Basta a esperança naquilo
Que talvez não teremos.
Basta que a alma demos,
Com a mesma alegria,
Ao que desconhecemos
E ao que é do dia-a-dia.
Chegamos? Não chegamos?
– Partimos. Vamos. Somos.
Sebastião da Gama
domingo, 3 de junho de 2007
Reflexo
Reflexo
Veredas intermitentes de maus sonhos e ocasos
Desembocam em marés de suor e olheiras fundas.
No espelho risca-se o desalento! Negações rotundas,
As que gravo em ónix e outras pedras raras, de olhos rasos.
Índole perversa, maus fígados, tumores, acasos,
Despeito, as glórias, podres credos, intenções segundas,
Íntegros senãos, roucas evasivas, carnes imundas
Infestam-me! Em tempo algum correu sangue nos meus vasos!
E a indolência é tal, tanta a estupefacção, a algidez tamanha
Que retorno ao enxergão. Placentas, colibris e dores
Assaltam-me. É o outro eu, o outro ninguém que ganha.
Reagir? Nunca! O universo e eu somos bons actores
E se, visceralmente, a sofreguidão me acompanha,
Recuso o Caos e a Ordem e procuro os meus arredores.
sábado, 2 de junho de 2007
Daquilo que eu sei...
Daquilo que eu sei
Nem tudo me deu clareza
Nem tudo foi permitido
Nem tudo me deu certeza
Daquilo que eu sei
Nem tudo foi proibido
Nem tudo me foi possível
Nem tudo foi concebido
Não fechei os olhos
Não tapei os ouvidos
Cheirei, toquei, provei
Ah! Eu usei todos os sentidos
Só não lavei as mãos
E é por isso que eu me sinto
Cada vez mais limpo
Cada vez mais limpo
Cada vez mais...
Ivan Lins
quinta-feira, 31 de maio de 2007
Depois do caos, o princípio
Depois do caos, o princípio
Erram agoiros e bezerros nos ciprestes!
Atónito, forjo borboletas e urdo
Tules! Delirantemente, em estupor absurdo!
Crepitam bucéfalos, pêssegos e pestes!
Gorgolejam sílfides e gáveas! Agrestes,
Dançam bússolas e horizontes, em tom surdo!
Envoltas em desassossego e linho burdo,
Virgens e penúrias inventam suas vestes!
Ainda estou! Ardem fonemas e oceanos
Em lume brando! Profetas e outros enganos
Esvaem-se em plasmas e doutas incongruências!
O que é o Céu? O que é o Longe? E o Destino?
A Luz, por fim! De rastos, quase clandestino,
Invoco o adeus e lembro perdas e ausências!
quarta-feira, 30 de maio de 2007
terça-feira, 29 de maio de 2007
Soneto Satânico
Soneto Satânico
Belzebu, sem cuidado, abriu um dia
As portas do inferno às mulheres
E logo se arrependeu. Já não ia
Conseguir desfrutar dos seus prazeres.
Benzeu-se, até! Debalde! A gritaria
Era tal que todos os afazeres
Foram descuidados e, ironia,
Ouviu, em si, uma voz: – Não desesperes!
Tridente em punho, olhos faiscantes,
Possesso com as novas habitantes,
Expulsou-as dali e correu a aldraba!
Logo uma, afoita, tomou o comando
De todas as outras e, blasfemando,
Instituiu "O Inferno da Diabba"!
segunda-feira, 28 de maio de 2007
Pedra Filosofal
Pedra Filosofal | ||
Eles não sabem que o sonho | Contraponto, sinfonia, | |
É uma constante da vida | Máscara grega, magia, | |
Tão concreta e definida | Que é retorta de alquimista, | |
Como outra coisa qualquer, | Mapa do mundo distante, | |
Como esta pedra cinzenta | Rosa-dos-ventos, Infante, | |
Em que me sento e descanso, | Caravela quinhentista, | |
Como este ribeiro manso | Que é Cabo da Boa Esperança, | |
Em serenos sobressaltos, | Ouro, canela, marfim, | |
Como estes pinheiros altos | Florete de espadachim, | |
Que em verde e oiro se agitam, | Bastidor, passo de dança, | |
como estas aves que gritam | Colombina e Arlequim, | |
em bebedeiras de azul. | Passarola voadora, | |
Pára-raios, locomotiva, | ||
Eles não sabem que o sonho | Barco de proa festiva, | |
É vinho, é espuma, é fermento, | Alto-forno, geradora, | |
Bichinho álacre e sedento, | Cisão do átomo, radar, | |
De focinho pontiagudo, | Ultra-som, televisão, | |
Que fossa através de tudo | Desembarque em foguetão | |
Num perpétuo movimento. | Na superfície lunar. | |
Eles não sabem que o sonho | Eles não sabem, nem sonham | |
É tela, é cor, é pincel, | Que o sonho comanda a vida, | |
Base, fuste, capitel, | Que sempre que um homem sonha | |
Arco em ogiva, vitral, | O mundo pula e avança | |
Pináculo de catedral, | Como bola colorida | |
Entre as mãos de uma criança. | ||
António Gedeão, Movimento Perpétuo, 1956 |
domingo, 27 de maio de 2007
Lembro-me bem do seu olhar
Lembro-me bem do seu olhar.
Ele atravessa ainda a minha alma,
Como um risco de fogo na noite.
Lembro-me bem do seu olhar. O resto...
Sim, o resto parece-se apenas com a vida.
Ontem passei nas ruas como qualquer pessoa.
Olhei para as montras despreocupadamente
E não encontrei amigos com quem falar.
De repente vi que estava triste, mortalmente triste,
Tão triste que me pareceu que me seria impossível viver amanhã,
Não porque morresse ou me matasse,
Mas porque seria impossível viver amanhã e mais nada.
Fumo, sonho, recostado na poltrona.
Dói-me viver como uma posição incómoda.
Deve haver ilhas lá para o sul das coisas
Onde sofrer seja uma coisa mais suave,
Onde viver custe menos ao pensamento,
E onde a gente possa fechar os olhos e adormecer ao sol
E acordar sem ter que pensar nas responsabilidades sociais
Nem no dia do mês ou da semana que é hoje.
Abrigo no peito, como a um inimigo que temo ofender,
Um coração exageradamente espontâneo,
Que sente tudo o que eu sonho como se fosse real,
Que bate com o pé a melodia das canções que o meu pensamento canta,
Canções tristes, como as ruas estreitas quando chove."
Fernando Pessoa - Poesias Inéditas
Carpe Noctem
Carpe Noctem
Implodem camiões e estrelas... É o deserto!
Nas cavernas límpidas esbracejam aranhas
Que querem escapulir-se pelo céu entreaberto,
Envoltas em soluços e penas tamanhas
Que a terra treme! Descrente, sinto um aperto!
Sorvo miragens. Escuto luzes. Cavo entranhas!
Sublimo zénites. Aguardo. E, então, converto
As histórias de embalar em mélicas sanhas.
Vêm fadas! Salta a carniça e, a poente,
Estanca o vinho e soçobram harpas e flautas.
Resguarda-se a noite, delicada, fremente.
Cai, por fim. Jasão convoca os Argonautas.
Anúbis recolhe-se em Néftis, indolente.
Aos braços de Nix tornam almas incautas.
sábado, 26 de maio de 2007
Depoimento
Posso apenas dizer que havia um muro
E que foi contra ele que arremeti
A vida inteira.
Não, nunca o contornei.
Nunca tentei
Ultrapassá-lo de qualquer maneira.
A honra era lutar
Sem esperança de vencer.
E lutei ferozmente noite e dia,
Apesar de saber
Que quanto mais lutava mais perdia
E mais funda sentia A dor de me perder.
Miguel Torga
terça-feira, 22 de maio de 2007
Poema 20
Puedo escribir los versos más tristes esta noche.
Escribir, por ejemplo: "La noche esta estrellada,
y tiritan, azules, los astros, a lo lejos".
El viento de la noche gira en el cielo y canta.
Puedo escribir los versos más tristes esta noche.
Yo la quise, y a veces ella también me quiso.
En las noches como ésta la tuve entre mis brazos.
La besé tantas veces bajo el cielo infinito.
Ella me quiso, a veces yo también la quería.
Cómo no haber amado sus grandes ojos fijos.
Puedo escribir los versos más tristes esta noche.
Pensar que no la tengo. Sentir que la he perdido.
Oír la noche inmensa, más inmensa sin ella.
Y el verso cae al alma como al pasto el rocío.
Qué importa que mi amor no pudiera guardarla.
La noche está estrellada y ella no está conmigo.
Eso es todo. A lo lejos alguien canta. A lo lejos.
Mi alma no se contenta con haberla perdido.
Como para acercarla mi mirada la busca.
Mi corazón la busca, y ella no está conmigo.
La misma noche que hace blanquear los mismos árboles.
Nosotros, los de entonces, ya no somos los mismos.
Ya no la quiero, es cierto, pero cuánto la quise.
Mi voz buscaba el viento para tocar su oído.
De otro. Será de otro. Como antes de mis besos.
Su voz, su cuerpo claro. Sus ojos infinitos.
Ya no la quiero, es cierto, pero tal vez la quiero.
Es tan corto el amor, y es tan largo el olvido.
Porque en noches como ésta la tuve entre mis brazos,
mi alma no se contenta con haberla perdido.
Aunque éste sea el último dolor que ella me causa,
y éstos sean los últimos versos que yo le escribo.
Pablo Neruda, Veinte Poemas de Amor y Una Canción Desesperada
Sem valor, sem juízo, sem perdão!
Alvarás decrépitos e juras de amor ditam mortes.
Suprimem-se dores e escoiceiam avencas pudibundas.
Infernizam-se em doces de mel e ovos os mais fortes.
Recolhem-se em seus eus as mariposas, meditabundas.
Castas cortesãs, abadessas vis, príncipes consortes,
Infames nobres, outros honestos, rainhas corcundas
Têm assento em miríades de funestas cortes,
Girândolas de gentes gelatinosas e imundas.
Escolhos persigo, e desnorteio ante o mar seráfico,
Supremo ser, sério e senil, de carácter biográfico,
Em que submerjo, enrolado em alísios e cetim.
Longe, em tropel, rinocerontes embalam suas crias
Enquanto marialvas e mafiosos contam os dias
De glória. Não obstante, são dilacerados. Enfim...